História do Estado

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A Corrida do Ouro

Com seu irmão, Manuel Lopes, apelidado o "Buá", João Lopes de Lima foi descobridor do ouro no Ribeirão do Carmo, futura Mariana, depois de 1698 e das diligências de Francisco Bueno da Silva e Antônio Bueno da Silva, Tomás Lopes de Camargo e João Lopes de Camargo e do capelão padre João de Faria Fialho. No dia de Nossa Senhora do Carmo, 16 de julho de 1698, a bandeira do capitão João Lopes de Lima e com ele seu irmão o padre Manuel Lopes,(Buá de alcunha) redescobriu o ribeirão d Mariana, a que chamou Carmo e "mandou repartir estando já em São Paulo o meu general" (são palavras escritas por José Rebelo Perdigão que cita assim o governador Artur de Sá e Menezes), "nomeando para isso por Guarda-mor destas Minas ao Sargento-Mor Manuel Lopes de Medeiros; e o ouro deste ribeirão se avaliou então por melhor que o de Ouro Preto". Outros autores falam em Diogo Pires Moreira e Francisco Alves de Castilho, de Taubaté, manifestando faisqueiras depois de João Lopes de Lima e Manuel Garcia, o qual teria descoberto outro córrego próximo. Eram de Atibaia. Foram seguidos pelo governador Artur de Sá e Menezes e por Manuel Lopes de Medeiros.

A repartição total do Ribeirão do Carmo somente se operou em 1700, em extensão de duas léguas, pelas barrancas do mesmo, prosseguindo os descobrimentos rio abaixo, que, de acordo com as esperanças, deu boas pintas. Ainda em 1701,Antônio Pereira Machado descobriu o ribeirão que guarda seu nome nas cabeceiras do Ribeirão do Carmo, mas no seu meio curso o ocupante foi Sebastião Rodrigues da Gama. O sucesso foi seu ouro, de excelente título e qualidade, mais alto que o de Ouro Preto, conhecido há dois anos. Escreverá depois Perdigão que "o ouro preto era mais agro e se fazia em pedaços ao ser colocado no cunho". Era o ouro chamado ouro podre, da serra de São João, a cavaleiro da futura Vila Rica. Outro códice da Biblioteca Municipal de São Paulo, o Códice Ameal, diz desse "ouro bravo, que é um ouro preto. E como depois de fundido se fazia em pedaços por não saberem dosar, o vendiam aos Paulistas a preço de cinco tostões e a 640 réis, que assim o davam em seu pagamento, donde ficou chamado ainda hoje a um quarto de pataca, ouro podre". Chamada corrida do ouro pois se uma pedra era avistada todos saiam correndo loucamente para ficar com ela.

Em O Abastecimento da Capitania de Minas Gerais no Século XVIII, assim resume as descobertas Mafalda P. Zemella: "Garcia Roiz Pais pode ser considerado o primeiro descobridor do ouro dos ribeiros que correm da Serra de Sabarabuçu;Bartolomeu Bueno de Siqueira, buscando a Casa da Casca, achou ouro na Itaverava; Salvador Furtado no Carmo; o Padre João de Faria no Ouro Preto; João Lopes de Lima achou mais no Carmo; Borba Gato no Sabará; Salvador Faria de Albernaz no Inficionado; Domingos Roiz da Fonseca Leme no Ribeirão do Campo, afluente do Velhas; Domingos Roiz do Prado no rio Pitangui; Bartolomeu Bueno no rio Pará; Mateus Leme no Itatiaiçu; Domingos Borges nas Catas Altas; os Raposos no rio das Velhas; Tomé Portes del Rei, João de Siqueira Afonso e Antônio Garcia Cunha no Rio das Mortes".

Primeiros povos e colonização

A região do atual estado de Minas Gerais foi ocupada, até o século XVI, por povos indígenas do tronco linguístico macro-jê: os xacriabás, os maxacalis, os crenaques, os aranãs, os mocurins, os atu-auá-araxás e os puris, entre outros[7].

Antes de se chamar Minas Gerais, o estado teve outros nomes como: Campos de Cataguá (na época das entradas e bandeiras), Minas Gerais dos Goitacazes, Minas Gerais do Ouro Preto,Capitania de Minas Gerais, Província de Minas Gerais e outros. O desbravamento da região pelos europeus teve início no século XVI, por bandeirantes paulistas que buscavam ouro, pedras preciosas e escravos índios.

Em 1693, as primeiras descobertas importantes de ouro na Serra do Sabarabuçu e nos ribeirões do Carmo e do Tripuí provocaram um grande afluxo migratório à região. Em 1696, foi fundado o arraial de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo, o qual, em 1711, se tornou a primeira vila de Minas Gerais, núcleo original do atual município de Mariana.

Já na correspondência do embaixador francês em Lisboa, Rouillé, há a primeira menção ao ouro chegado na frota em 1697, quando se referiu a ouro peruano, equivocadamente - haviam chegado 115,2 quilos de ouro do Brasil, seguramente. Faltam elementos para julgar o ouro entrado no Reino de 1698 a 1703 mas Godinho, sem citar a fonte, menciona, em 1699, 725 quilos e, em 1701, 1 785 quilos.

André Antonil, em seu livro Cultura e Opulência do Brasil por suas Drogas e Minas, escrito em 1711, detalha a situação difícil dos primeiros "geralistas" (depois chamados "mineiros"), citando a alta carestia de vida, a falta de alimentos, os ataques dos índios e o alto preço dos escravos.

A descoberta das minas e a exploração do ouro desencadearam alguns conflitos, sendo os mais importantes a Guerra dos Emboabas (1707-1710) e a Revolta de Felipe dos Santos.

A Ausência do Estado

Portugal começou, desde o início do século XVIII, a se inquietar com as minas. É datada de 7 de fevereiro de 1701 carta régia de dom Pedro II que proíbe completamente a Artur de Sá e Menezes comunicação e comércio entre a Capitania daBahia e o que chama "minas de São Paulo", isto é, a região mineira dos Cataguás, Caeté e Rio das Velhas. Pensava a Corte poder resolver as fraudes ao Quinto ocasionadas com comércio muito ativo - mas como aplicar a lei com rigor em região tão vasta, tão deserta, sem soldados nem funcionários? Ficou porém proibida a passagem de escravos de Pernambuco e Bahia para o Sul, e tampouco era permitida a entrada de mais gente para as Minas. Os infratores achados em caminho deveriam ser presos e punidos com penas severas de cárcere e deportação, além de ter confiscada sua fazenda. Foi o início de tentativas desesperadas de "fechar" as minas.

Não havia estrutura judiciária em Minas. Os ouvidores gerais residiam no Rio e em São Paulo, e visitavam em correição, o que significa em viagem de inquéritos e julgamentos, mas se limitavam a ir aos principais arraiais. Só após as graves desordens de 1709, com a sublevação de Manuel Nunes Viana, a divisão da Capitania de São Vicente nas capitanias de São Paulo e Minas de Ouro e na do Rio de Janeiro. Só a chegada de um governador na nova Capitania de São Paulo e Minas de Ouro fez montar uma estrutura administrativa e judiciária conveniente, o que se deu após 1710-1711.

Em 1714, foram criadas as comarcas:

  • Comarca de Ouro Preto, com sede em Vila Rica;
  • Comarca do Rio das Mortes, com sede na recém-criada Vila de São João del-Rei;
  • Comarca do Rio das Velhas com sede na Vila de Sabará.

"Os aventureiros que concorriam", diz um cronista, "eram tão pobres que conduziam às costas quanto possuíam. Graças à caridade dos Paulistas, logo que entravam uns achavam cama e mesa nas casas destes descobridores: outros recebiam o mantimento somente, mas todos obtinham introdução nas lavras, até que ajuntando ouro se habilitassem para viverem às suas expensas". Mas, na linguagem popular dos mineiros, logo "forasteiro" passa a sinônimo de adversário. Os portugueses e seus aliados, os baianos sobretudo, seriam chamados "emboabas"".

Em 18 de abril de 1701, um ato do governador Artur de Sá e Menezes criou, para o fisco (para a arrecadação do tributo do Quinto sobre o ouro), os cargos de Superintendentes, escrivães, tesoureiros e registros nos caminhos dos campos gerais para o Rio de Janeiro, São Paulo,Pernambuco e para a Bahia, proibindo a circulação e a saída de qualquer pessoa de Minas sem guia do ouro pela qual mostrasse haver pago o tributo de um quinto.

Foram as primeiras providências sobre policiamento das minas e concessão dos terrenos: cobrança do quinto, recebedorias, guias. Desde então até 1820 segundo dados oficiais, mas doravante cada vez mais deficientes, a quantidade de ouro extraída sobre a qual incidiram os impostos atingiu 41 000 arrobas ou 615 000 quilos, não se podendo contar o ouro extraido e que, apesar da feroz vigilância, passou por contrabando. E eram grosseiros e primitivos os processos empregados na exploração das minas. No tempo colonial, o ouro valeu entre 1$200 e 1$500 a oitava, e por esse preço baixo a importância de tais arrobas sobe a 250,000:000$000 do tempo.

Em 7 de dezembro de 1705, o desembargador sindicante João Pereira do Vale respondeu a uma carta régia de 20 de março e escreveu um verdadeiro relatório ao rei dom Pedro II de Portugal com sua avaliação sobre a casa da moeda do Rio e o estado das Minas, em que estima a população das Minas ("serem couto de foragidos é o maior mal") em mais de 30 000 pessoas. Fala dos frades, "tão pouco regulados em seu procedimento e ações que seria servido de Deus e de Vossa Majestade mandarem seus prelados que todos se recolhessem e só passassem Padres da Companhia e alguns missionários". Falando das numerosas fraudes dos habitantes e Minas, diz - "afirmam os de maior experiência e melhor ponderação que se do ouro que nelas se tira cada ano se pagassem os quintos e datas com pontualidade, teria Vossa Majestade mais de cem arrobas cada ano.»

De 1705 em diante, escasseaiam as lavras fáceis de aluvião, obrigando a transformar o sistema da mineração por serviços em terra firme, obrigados a desmonte e regos de grande custo; os reinóis passam a mineiros. Conhecidos e amparados pelos compatriotas opulentos de praças marítimas, que lhes forneciam a crédito escravos e instrumentos, as terras mais ricas e regiões mais férteis passaram a ser de reinóis e baianos com tais elementos à disposição. Os Paulistas, em rápida decadência, procuraram novos ribeiros, largando seus arraiais e lavradios, refugiando-se na lavoura de roças. Os antigos magnatas ficam nivelados com a plebe solta nas Minas e a velha divisão de raças cedeu à nova divisão entre ricos e pobres, os ricos virando cabecilhas improvisados à frente de clientes façanhudos, de recente grandeza, impondo-se pelo terror a povoações inteiras. É a época dos concubinados e bastardos: população orçada em 30 000 almas, caminhos livres e francos, mercados abundantes, soltas forças da anarquia. O primeiro incidente de caréter vagamente nacionalista ocorre na Ponta do Morro.

Conflitos Gerados pelo Ouro

A invasão brutal e em atropelo impacientou até espectadores desinteressados, como o Padre Belchior de Pontes, que esconjurara, da aldeia de São José onde vivia, aqueles paulistas que se dirigiam para as minas, profetizando desgraças que sucederiam no grande levantamento futuro. O jesuíta antevia os ódios que iriam se desatar nas Minas Gerais, ontem sertões, habitados de feras e gentio. Os arraiais foram poucos, mas manifestado o ouro, surgiram de toda a parte: local para o lazer, a compra e a reza, não eram era domicilio nem lar, apenas uma demora, com caráter de provisoriedade e improvisação, o importante era a cata, a mineração, no fundo dos vales. Levavam vida grosseira, rude, somente com o lar e a mulher surgiriam preocupações de conforto.

Em 6 de fevereiro de 1705, uma ordem real declarou que a licença de passar às Minas só seja dada às pessoas de qualidade. Estaria a côrte alarmada na crença da extinção fácil das minas? Desde ofício de 20 de maio de 1698 de Artur de Sá e Menezes, havia ansiedade da corte: seriam menos ricas, seriam duráveis? Até 1704, houve dúvida: só quando se descobrem as camadas e veeiros da serra do Ouro Preto, formações regulares e de nunca vista fertilidade, crêem no resultado final e no destino das Minas - e o rei resolve derrogar as ordens proibitivas, franqueia caminhos. Com esta nova política, os Paulistas se sentem vencidos; reconcentram seu ódio nos forasteiros.

No século XVII, as drogas da terra em São Paulo eram a farinha, panos de algodão, redes, trigo, marmelo, couros e carnes. A grande maioria dos tropeiros era reinol, movimentando o giro comercial "Paulista", pois o natural da terra desprezava o comércio como degradante. Do Rio de Janeiro subiam para as Minas os artigos da terra, como açúcar, aguardente, gado, feijão, arroz e farinha, e artigos importados como vidros, espelhos, sedas, damascos, pelúcias, baixelas, vinhos, azeites, armas, pólvora, sal, ferro etc. - e os escravos. A Bahia, dada a grande facilidade de comunicação terrestre e a navegação pelo Rio São Francisco, era zona de povoamento antigo, havia currais no sertão, importante centro importador de artigos europeus - a proibição do capítulo XVII do Regimento nunca pode ser efetiva, a onda de contrabando foi irreprimivel, pois os moradores não permitiam, eram todos «tão absolutos que qualquer vaqueiro ou Paulista metido com a sua escopeta pelos matos daqueles sertões nem todos os exércitos da Europa parece serão bastantes para o impedirem que entre e saia para onde quiser». Se não fosse boiadeiro, não poderia, teoricamente, entrar. Outro produto, além do gado, foi o escravo - o contrabando era irrefreável. A princípio os senhores de engenho vendiam seus negros gostosamente - depois com a elevação do preço, não mais. Potentados em gado, senhores das fazendas, tropeiros e comboeiros de negros se foram congraçando e associando: uma das maiores figuras do contrabando foi Manuel Nunes Viana mancomunado com outros portugueses e baianos (no fundo, defendia os direitos que tinham os mineradores de alimentar-se, vestir-se e comprar de que quisessem, as coisas de que careciam) contra Borba Gato, Paulista defendendo a causa do rei.

Guerra dos Emboabas

As descobertas importantes de ouro provocaram uma corrida cheia de incidentes, sendo o mais grave a Guerra dos Emboabas (1707-1710), onde os luso-baianos derrotaram os paulistas, que ocupavam anteriormente a região aurífera - os tupis que descobriram as minas possuiam bem mais afinidades com eles e realmente foram os grandes responsáveis por ceder a informação do ouro - obrigando-os a emigrar para o Centro-Oeste, onde outros grupos de índios, aliados dos paulistas, haviam descoberto ouro. Só que a transferência da capital foi em vão, já que os comerciantes judeus de Salvador eram os maiores traficantes de ouro e diamantes ilegais de toda a atual Minas Gerais e região Centro-Oeste, transformando o Rio São Francisco num grande exportador das riquezas de Minas (e o ícone-mor desta época é a igreja de São Francisco emSalvador, que nada possui de franciscana e tudo que tem é ouro contrabandeado por baianos do século XVIII).

Capitania de São Paulo e Minas de Ouro

Foi criada a Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, separando-se da Capitania do Rio de Janeiro. A carta Régia data de novembro de 1709. As novas capitanias de São Paulo e Minas do ouro seriam somente capitania quando tivesse seus povoados de maior importância, organizados de acordo com as Ordenações do Reino, com câmaras municipais, Justiça, repartições arrecadadoras de tributos régios, Secretaria com livros de Atos, Cartas- Régias, Cartas-Patentes e Caixas Fiscais. O novo governador, Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho, recebeu ordem de velar pela fundação de povoações e tratar Paulistas e Reinóis com a mesma equidade, «uns e outros tendo a mesma condição de vassalos».